O século XX, a era dos extremos, os anos que apresentaram à humanidade um mundo cada vez mais globalizado, mas que, ao mesmo tempo, demonstraram a capacidade dos mais diferentes líderes e sociedades, sob determinadas condições, realizarem as mais atrozes violências em prol de suas causas.
As marcas do imperialismo ao redor do mundo, as opressões neocoloniais em constante expansão, o intenso e progressivo desenvolvimento armamentista das mais poderosas nações do planeta produziram um um resultado devastador: a guerra. A segunda década daquele século serviu para mostrar ao mundo o rumo que nossas decisões estavam tomando, e, pior que isso, sob o sangue de milhões de homens, mulheres e crianças, plantou-se a semente dos mais tenebrosos movimentos que viriam a eclodir na Europa daquele tempo, poucos anos após o cessamento do fogo entre as trincheiras.
As estruturas de todo o globo estremecidas, um continente em ruínas, assolado pelos males da desigualdade, da miséria, da fome e do desemprego. Sob a imposição de inúmeras sanções, pelo ódio dos países considerados os perdedores da guerra, colocava-se ali o ovo da serpente, que revelaria sua face ao mundo nos anos seguintes. Naquele momento, as crises econômicas e sociais trazidas pelos conflitos armados e as mãos de ferro de homens que se dedicaram a unificar suas nações em torno de seus vis objetivos começaram a escrever um dos mais sombrios capítulos da história mundial.
Mas e você? Sabe do que se trata esse período? Você sabe de onde veio o fascismo?
Os anos que procederam o fim da primeira das duas guerras mundiais foram marcados por uma série de eventos literalmente revolucionários, principalmente no que se refere ao continente europeu. Caía o Czarismo russo pela união das foices e martelos soviéticos, instauravam-se as frágeis tentativas de governos democráticos e republicanos, e reconstruía-se, aos poucos, o velho continente, absolutamente destruído pela 1ª Guerra Mundial. Nesse cenário, a necessidade da solidariedade entre trabalhadores de todo o continente, em prol do combate às fortes mazelas sociais que se instauravam naquele momento, teve como resultado o avanço dos movimentos sindicalistas em diversos países, muito influenciados também pela recente instauração do socialismo soviético.
Pouco se sabia sobre o futuro, muito se especulava acerca dos anos vindouros, mas somente um sentimento regia o mundo naquele momento: o medo de qualquer coisa que se assemelhasse ao que foi vivenciado nos anos sangrentos dos conflitos armados.
O medo é um sentimento perigoso. Ele é capaz de levar pessoas normalmente bem intencionadas a se calarem perante atrocidades, ou até mesmo a apoiá-las. De fato, a maior parte das pessoas eram temerosas ao extremismo propiciado pela guerra, mas outras foram absolutamente consumidas pela vergonha e humilhação, principalmente nos países que mais sofreram sanções internacionais após o cessar fogo, e foi sob essas condições que vieram à tona os líderes que traduziriam esses vis sentimentos nas palavras e ações que muitos gostariam de expor, mas não possuíam a coragem necessária.
Benito Mussolini, um ex-membro do Partido Socialista Italiano, expulso por apoiar a entrada do país na guerra mundial, foi o primeiro grande expoente dessas lideranças. Após o fim do evento, em 1919, passou a organizar seu próprio grupo, ao lado de ex-combatentes do conflito, e fundou, em 1920, o Partido Nacional Fascista, sob égides como o patriotismo, fortificação da segurança nacional, retomada da grandeza do país no cenário global e construção de um novo, forte e respeitoso, Estado italiano, com sua ideologia simbolizada pelo antigo fascio de littorio, antigo símbolo de poder do império romano.
Naquele momento, a história da Europa estava escrita, e não se imaginava as proporções que aquela ação de organização política iria tomar.
Já em suas primeiras eleições, o novo partido foi capaz de ocupar 20 cadeiras no Congresso Nacional, com deputados que passaram a promover institucionalmente ideias autoritárias e militaristas dentro do Estado italiano. Para muitos europeus, este poderia parecer um indicador preocupante, mas para boa parte da população italiana, que se via como membros de uma sociedade enfraquecida e desrespeitada, que passou a viver com o medo constante do desemprego, da instabilidade econômica e da hostilidade internacional, esse tipo de discursos era absolutamente atraente, e mais, para muitos, necessário.
Foi a partir disso que o partido fascista ascendeu politicamente, por meio do voto, através da democracia, pôde tornar legítimas suas ações e aspirações antidemocráticas.
Em 1922, promoveu-se o grande evento que mudaria para sempre a história do pós-guerra, de um tempo em que se buscava a paz, a prosperidade e a estabilidade no mundo, para um de revanchismos, autoritarismo e atentados à democracia. Este evento foi a Marcha Sobre Roma, marcada por milhares de homens com camisas negras, fascistas que tinham a intenção de pressionar o rei Vitor Emanuel III a nomear seu líder para o cargo de primeiro-ministro do país, o que marcava de uma vez por todas o fim da ascensão democrática do fascismo, e o início de seu escalonamento através das armas e do terror. O movimento é bem-sucedido. Mussolini sagrava-se, naquele momento, como o grande chefe de Estado italiano.
Um dos grandes marcos de sua regência foi a criação de uma milícia fascista, em nome da segurança nacional, que passou a exercer o poder autoritariamente e reprimir com violência qualquer um que se opusesse ao regime. O culto a um Estado cada vez mais repressor, à masculinidade violenta, ao militarismo, aos símbolos nacionais e às lideranças fascistas passaram a ser valores centrais do governo, assim como o extermínio a tudo o que era contrário a seus baluartes, como socialistas e demais subversivos.
Nas eleições seguintes, a população foi violentamente pressionada a eleger membros do partido fascista para os principais cargos institucionais, e o povo, que ajudou o regime a chegar no poder, passou a questioná-lo com mais afinco, principalmente após o assassinato de um dos líderes opositores políticos, o representante socialista Giacomo Matteotti. Mas já era tarde para contestações, e essa abertura de olhares somente serviu de subterfúgio para tornar o governo ainda mais antidemocrático e militarista. A partir dali, seria custoso e demorado para que o monstro que foi democraticamente criado fosse destruído.
Muito há o que se falar sobre o regime fascista na Itália, e também sobre os outros países para os quais ele se espalhou ideologicamente. Da Alemanha de Hitler, à Espanha de Franco e Portugal de Salazar, os ideais fascistas se disseminaram de diversas formas pela Europa, e foram a principal causa de eclosão da futura Segunda-Guerra Mundial. Dentre todos os casos, destaca-se as características comuns que levaram essas ideias ao topo da política europeia: sociedades em reconstrução, sofrendo com os males da desigualdade, desemprego e miséria, com suas populações vivendo sob medo constante do futuro próximo.
Justamente esse medo os levou a se distanciar de possíveis ideais democráticos para apoiar os valores autoritários, preconceituosos, excludentes e violentos de líderes demagogos e antidemocráticos.
O sentimento de pânico generalizado abriu o caminho para a ascensão do fascismo e deu-lhe as ferramentas necessárias para justificar atrocidades em nome de um estado forte e unificado.
Por Pedro E. (UFRJ – Brazil)
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